Jeane Santos Gavazza [1]
Resumo: O imaginário infantil tem, nos últimos tempos, sido invadido pela diversidade de informações oferecidas pelos meios de comunicações visuais. Muitas vezes, esses recursos, em especial a televisão, são utilizados como “tapa-buracos”, com o objetivo de preencher o tempo ocioso do mundo infantil. O presente artigo tem por finalidade questionar e analisar as influências da televisão na educação das crianças numa sociedade que está, cada vez mais, sendo alvo da manipulação da mídia, que estereotipa as informações favorecendo interesses da classe dominante. Ao fim, ressalta a importância de uma orientação adequada para o uso dos programas infantis pelas crianças.
Palavras chaves: Programas infantis, criança, televisão e educação.
Introdução
A televisão é o meio de comunicação mais utilizado pelas pessoas. Esse recurso é um grande instrumento de penetração da cultura, porém tem o poder de criar as mais variadas significações, estereotipar realidades e, conseqüentemente, manipular os telespectadores. Desde a década de 60, a televisão é o meio mais usado para manipulação de ideologias e informações.
Segundo Ferres (1994),
“o estereótipo é um recurso eficiente para alcançar o sucesso fácil porque pressupõe uma simplificação da realidade e para o espectador é mais confortável descodificar algo simples que algo complexo. Mas o estereótipo é um dos recursos mais eficientes da manipulação. A verdade é complexa, de forma que qualquer simplificação é uma mentira”.
Tal citação aponta a estereotipia como um dos artifícios utilizados para manipular informações e/ou gerar nos manipulados, no caso debatido os telespectadores, uma série de significados, tendências e comportamentos que façam prevalecer os ideais de um grupo ou classe dominante.
A programação infantil também é alvo da manipulação. Considerando que a mesma é construída por pessoas mais velhas que representam e reproduzem, como dito anteriormente, os interesses, as idéias e os comportamentos de um determinado grupo, o mundo infantil acaba reproduzindo as idéias, vontades e comportamentos dos adultos.
E o que fazer? Como trabalhar os desenhos, os programas, os filmes, ou seja, as produções televisivas com as crianças? A responsabilidade é da escola ou da família? Tais questionamentos representam a dificuldade de lidar com o uso adequado da televisão para a educação infantil, já que as crianças ficam, muitas vezes, à mercê da manipulação televisiva.
A criança e os programas infantis.
O aprendizado infantil se dá através do jogo simbólico, com imitação da realidade ou do mundo imaginário, além de submissão à superiores ou da relação direta com a realidade. A programação infantil, principalmente o desenho animado, possibilita o desenvolvimento da cognição através do jogo simbólico, pois alimenta o imaginário infantil com tantos contos e fantasias. Além disso, os programas infantis são usados, na maioria das vezes, como forma de minimizar o tempo vago das crianças.
Em contrapartida, a televisão dificulta as relações diretas, como afirma Ferrés ao entender que :
“A televisão dificulta, em principio, a experiência direta, mas tem autoridade e torna-se atraente, sendo assim um instrumento eficiente de penetração cultural ao potencializar, por intermédio desses meios o aprendizado de conhecimento e de comportamento.” (Ferrés, 1994, p. 57)
Tal citação ratifica o fato de que o poder de atração da televisão acaba minimizando as relações entre a criança e o mundo real. Muitas vezes as crianças acabam perdendo a naturalidade infantil para reproduzir apenas fatos ocorridos em programas televisivos, intensificando a penetração cultural pelos meios de comunicações visuais.
A interação entre a criança e a televisão é intensa, e por isso, o poder de penetração da cultura através da TV, que já é potencializado, pode ser multiplicado devido às características próprias da percepção infantil. O mundo infantil é provido de poucas experiências prévias, não possuindo, desta forma, uma ideologia, pois têm poucos valores assumidos, além de ainda serem heterônomos no plano moral.
A heteronomia representa a incapacidade de compreender as regras e os valores morais no sentido dos adultos, da sociedade. Segundo Branco, “as regras e os valores são concebidos como entidades absolutas, que emanam de uma autoridade adulta...” (2003). Essa citação confirma a grande influência estabelecida na relação entre adultos e crianças, e conseqüentemente, a televisão possui o mesmo poder. Com isso, a criança fica muito mais vulnerável às manipulações ideológicas, do que os adultos, que já são autônomos, possuidores das regras morais.
Considerando que o poder de atração das comunicações visuais, mais especialmente a televisão, facilita a manipulação do imaginário infantil. É notável que, hoje, muitas crianças substituem as brincadeiras infantis tradicionais, como cantigas de roda, amarelinha, pião, para o uso intenso dos recursos televisivos. Desta forma, por conta do jogo simbólico, a imitação dos apresentadores dos programas, de atores e outros “famosos”, dos heróis e personagens de desenhos animados, torna-se uma constante.
Nessa imitação é visível grande influência da mídia na vida das crianças. Percebe-se uma uniformização de comportamento e padrões estéticos, onde o consumo, a moda e a beleza são supervalorizados. Com isso, as crianças crescem com um estereótipo formado por concepções, nem sempre, verdadeiras.
Esse comportamento, diante dos recursos visuais, gera um novo conceito de infância, que segundo Giroux (1995) é resultado das sucessivas mudanças na sociedade, principalmente no aspecto tecnológico, já que as crianças são educadas com influências dos meios de comunicações visuais. Com tal realidade, como a escola e a família estão lidando e como devem lidar com essa “nova criança”?
Televisão, escola e família.
A interação entre a televisão e a vida das crianças deve ser feita conjuntamente entre a escola e a família. A família deve proporcionar um ambiente adequado para o uso da televisão, considerando que a maioria do tempo ocioso se passa em casa. Já a escola tem maior responsabilidade, por estar comprometida com a formação do educando.
Nos dias atuais, a maioria das famílias não provém de tempo suficiente para a educação dos filhos, tornando, desta forma, a escola a maior responsável pela educação. Com isso, o uso dos desenhos e da televisão deve ser mais trabalhado pelos professores, com a formação dos alunos e dos pais.
Vale considerar que a televisão não deve ser apenas mais um recurso para as aulas, mas um meio que possibilite diferentes formas de interação entre os saberes dentro da sala de aula. Para isso, vale considerar duas dimensões, a de educar com a televisão e a de educar na televisão.
Segundo Ferrés (1994) educar na televisão consiste em transformar a TV em objeto ou matéria de estudo, “educar na linguagem audiovisual, ensinar os mecanismos técnicos e econômicos de funcionamento do meio, oferecer orientação e recursos para análise crítica dos programas”. Desta forma, transformará o educando em um sujeito crítico e consciente da realidade social e humana.
Educar com a televisão significa adicionar a televisão à sala de aula não como forma de aumentar o seu consumo, mas de melhorar o processo de ensino- aprendizagem. Por fim, essas dimensões são complementares, pois “quanto mais se educa com o meio, mais se educará no meio.” (Ferrés, 1994)
Por fim, é função do professor:
“... pesquisar que mecanismos a TV aciona para incentivar o aluno, e tentar instituí-los nas atividades em sala de aula.” (Marcondes Filho,1948).
Na sala de aula, o professor deve estar sempre atento às formas como a televisão afeta o comportamento dos seus alunos, utilizando a riqueza deste meio de comunicação como elemento propulsor na busca de novas alternativas para a sua prática, seja na docência, seja na pesquisa.
É notável a necessidade de uma educação participativa com a escola e a família, onde a educação escolar deve dar um significado ao uso dos recursos visuais. Desta forma, a televisão não será usada como “tapa-buracos”, podendo ser ponto de partida para discussões relevantes para o aprendizado.
Considerações Finais
A utilização da televisão para a educação das crianças é muito usada na realidade social vigente. Os programas infantis são usados como forma de ocupar o tempo vago das crianças, além de serem alvo da manipulação televisava, pois reproduzem ideais da classe dominante.
Nesse contexto, a orientação de pais e, principalmente, de professores, diante dos programas infantis, é imprescindível para a formação da criança, tornando-as autônomas. Em termos educativos, isso implicará numa formação de sujeitos críticos conscientes da realidade social.
Referências Bibliográficas
Marcondes FILHO, Ciro. Televisão: a vida pelo vídeo. 13. Ed, São Paulo: Moderna, 1948.
FERRÉS, Joan. Televisão e Educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
BRANCO, Maria Luísa. Construção da autonomia moral: a construção da teoria do desenvolvimento do ego de Jane Loevinger. (2003). Disponível em <http://sites.ffclrp.usp.br/paideia/artigos/25/01.pdf>. Acessado em 27/11/2007.
GIROUX, Henry A. Animating Youth: the Disnification of Children's Culture. 1995. Disponível em <http://www.henryagiroux.com/online_articles/animating_youth.htm>. Acessado em 27/11/2007.
[1] Graduanda do 4º semestre do Curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia